O NOVO TIPO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PREVISTO NO ART. 10-A, DA LEI FEDERAL Nº 8.429, DE 1.992

O NOVO TIPO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PREVISTO NO ART. 10-A, DA LEI FEDERAL Nº 8.429, DE 1.992

Gina Copola

Publicado no Boletim de Administração Pública Municipal, Fiorilli, fev./17, assunto 311; Fórum Administrativo, jul./17, p. 55

I – A Lei Complementar nº 157, de 2.016, incluiu um novo tipo de ato de improbidade administrativa à Lei federal nº 8.429, de 1.992, em seu art. 10-A, que, conforme se observa, foi acrescido aos três tipos de ato de improbidade administrativa que já existiam e cuidavam dos atos de improbidade administrativa de enriquecimento ilícito (art. 9º), de dano ao erário (art. 10), e de afronta aos princípios (art. 11).
É de império ter presente desde já que o novo tipo de ato de improbidade administrativa somente produzirá efeitos após o decurso do prazo referido no art. 6º, da LC nº 157/16, que é de 1 (um) ano.
Vejamos o que reza o novel dispositivo da LIA:
“Art. 10-A. Constitui ato de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão para conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõem o caput e o § 1º do art. 8º-A da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.”

II - E o art. 8º-A, da LC nº 116, de 2.003, a seu turno, reza que:
“Art. 8o-A. A alíquota mínima do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza é de 2% (dois por cento). (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)
§ 1o O imposto não será objeto de concessão de isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima estabelecida no caput, exceto para os serviços a que se referem os subitens 7.02, 7.05 e 16.01 da lista anexa a esta Lei Complementar. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)
§ 2o É nula a lei ou o ato do Município ou do Distrito Federal que não respeite as disposições relativas à alíquota mínima previstas neste artigo no caso de serviço prestado a tomador ou intermediário localizado em Município diverso daquele onde está localizado o prestador do serviço. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)
§ 3o A nulidade a que se refere o § 2o deste artigo gera, para o prestador do serviço, perante o Município ou o Distrito Federal que não respeitar as disposições deste artigo, o direito à restituição do valor efetivamente pago do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza calculado sob a égide da lei nula.”
Tem-se, de tal sorte, que o mais recente tipo de ato de improbidade administrativa visa punir o administrador Municipal ou do Distrito Federal – o imposto citado é de competência dos Municípios e do Distrito Federal apenas – que conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõe a citada Lei.

III - O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, repita-se, é de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e com alíquota mínima de 2% (dois por cento), tendo como fato gerador a prestação dos serviços previstos de forma expressa no Anexo da LC nº 116/03, com a redação que lhe foi dada pela LC nº 157/16.
E conforme se depreende da leitura § 2º, do art. 8º-A, da LC nº 116/03, os Municípios e o Distrito Federal estão obrigados a respeitar a alíquota mínima de 2% (dois por cento), sob pena de prática de ato de improbidade administrativa.

IV – As penas previstas para o mais recente ato de improbidade administrativa constam do inc. IV, que foi acrescido ao art. 12, da Lei federal nº 8.429, de 1.992, e podem ser as seguintes:
“Art. 12 Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (....)
IV - na hipótese prevista no art. 10-A, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito) anos e multa civil de até 3 (três) vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)”
Sobre a pena de multa civil já tivéramos ensejo de dizer em manifestações pretéritas que a consideramos inconstitucional, porque é pena que não está prevista no art. 37, § 4º, da Constituição Federal.
Reza o art. 37, § 4º, da Constituição Federal:
“Art. 37 (.....)
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”
E o art. 12, da LIA, conforme se lê, prevê a pena de multa civil, sendo que a Constituição Federal, em seu supratranscrito art. 37, § 4º, não prevê tal pena.
Com todo efeito, cabia à Lei federal nº 8.429/92 apenas graduar as sanções previstas pelo art. 37, § 4º, da Constituição Federal, e nada mais que isto, conforme ensina MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS .
Assim sendo, as penas acima citadas e não previstas na Constituição Federal restam absolutamente inconstitucionais, porque extrapolam o contido no indigitado dispositivo constitucional.
No mesmo diapasão, é a lição de TOSHIO MUKAI, em célebre artigo intitulado Fantasmagórica ameaça das ações de improbidade administrativa, publicado no Boletim de Direito Administrativo - BDA, da editora NDJ, SP, de março/00, pp. 191/192, de onde se lê o seguinte excerto:
“Em matéria de sanções, a interpretação há de ser restritiva, não cabendo ao legislador criar sanções não previstas para o caso, na Constituição. Em Direito Público, o que não está autorizado, está proibido.”

V – E, ainda, também foi incluído novo § 13 ao art. 17, da LIA, para introduzir nova pessoa jurídica interessada legitimada a propor ação de improbidade administrativa, que é o ente tributante que figurar no pólo ativo da obrigação tributária de que trata o art. 8º-A, da Lei Complementar nº 116/03, ou seja, têm legitimidade para propor a ação o Distrito Federal e os Municípios que forem prejudicados com as “isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima estabelecida no caput”, do art. 8º-A.

VI – E, por fim, é de império tecer alguns comentários sobre o elemento subjetivo necessário à configuração do tipo mais recente de ato de improbidade administrativa.
Nosso entendimento é que o ato previsto no art. 10-A, da LIA, só se configura se existente o elemento subjetivo do dolo.
É o que temos defendido enfaticamente.
Tem-se, conforme temos iterado e reiterado, que a configuração do ato de improbidade administrativa necessita, obrigatoriamente, da ocorrência do dolo, não bastando, portanto, a culpa do agente, sendo que tal posicionamento doutrinário e jurisprudencial é o majoritário.
Com todo efeito, sem a figura do dolo é virtualmente impossível a caracterização de improbidade administrativa, porque o ímprobo é aquele que teve a vontade, a intenção, ou o animus de causar lesão ou prejuízo ao erário público, bem como aos princípios constitucionais que norteiam a Administração.
Tanto na doutrina quanto sobretudo na jurisprudência é majoritário o entendimento segundo o qual nas ações de improbidade administrativa deve ser demonstrado que o agente público – ou os terceiros que concorreram para a prática do ato – utilizou-se de expediente que possa ser caracterizado como de má-fé, com a nítida intenção de prejudicar o interesse público e o erário, e apenas assim, portanto, poderá ser alegada a improbidade administrativa.
O elemento subjetivo dos tipos contidos na LIA, de tal sorte, é o dolo e apenas o dolo, decorrente da vontade do agente público causar dano ou prejuízo à Administração Pública. Sim, porque a intenção do ímprobo é alcançar benefício próprio ou de terceiro, em detrimento do interesse público.
Com efeito, “a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil.”, conforme já decidiu o e. STJ, relator Ministro GARCIA VIEIRA, RESP nº 213994/MG, 1ª T., DJ de 27.09.99, p. 59.
Ninguém, portanto, é ímprobo por acaso, nem desonesto por imperícia, nem velhaco por imprudência, nem inidôneo se não quiser sê-lo ostensiva e propositadamente. Com todo efeito, sem o elemento volitivo presente; sem a vontade de delinqüir, de lesar, de tirar ilegítimo proveito, de locupletar-se indevidamente, de enriquecer ilicitamente, ninguém pode ser inquinado de improbidade, uma vez que essa pecha somente tem sentido técnico-jurídico, e mesmo lógico, se e quando imputada ao mal-intencionado, ao desonesto de propósitos, ao golpista, ao escroque. Quem não se enquadra n’alguma dessas infames categorias será tudo no planeta - menos praticante de ato de improbidade.
Improbidade é figura que, em direito penal, civil ou administrativo, exige a essencial intencionalidade delitiva, a vontade ativa e efetiva de praticar ato sabidamente não admitido pelo direito. Trata-se da má-fé plenamente caracterizada, é a má intenção do agente.
De tal sorte, ausente o elemento volitivo, então nenhuma improbidade jamais poderá ser imputada a ninguém.
A improbidade não pode ser atribuída a quem apenas esquece de mera formalidade, ou comete pequenas irregularidades, sendo que tais atos não têm, nem poderiam ter, o condão de causar lesão aos cofres públicos ou aos princípios constitucionais que devem reger a Administração Pública, e, por isso, não podem ser reputados como atos ímprobos.
Tem-se, portanto, e conclusivamente, que o ato de improbidade administrativa que está previsto no aqui comentado art. 10-A, da LIA, só se configura se comprovado o dolo do agente.
É nosso entendimento.