SUCUMBÊNCIA TRABALHISTA É A MAIS AMPLA POSSÍVEL

SUCUMBÊNCIA TRABALHISTA É A MAIS AMPLA POSSÍVEL

 

Ivan Barbosa Rigolin

(fev/21)

 

I – Independentemente de qualquer outra consideração, um mérito inegável do governo do Presidente Michel Temer foi o de ter conseguido aprovar a denominada reforma trabalhista, não constitucional mas apenas legal, através de aprovar a Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2.017, a qual tão somente modificou a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.

Não foi como poderia ter sido dita reforma, como nenhuma das grandes reformas institucionais jamais é, porque as pressões contrárias -  públicas e privadas, declaradas e ocultas,  oportunas e inoportunas, de todas as naturezas a iniciar pela financeira  – são  monumentais, e costumam esmagar resistências, pisotear intenções publicísticas em nome de interesses bem localizados, e manietar  o trabalho de estadistas a serviço do país e não daqueles segmentos.

Os grupos de pressão – verdadeiras autoclaves políticas... -  as corporações e os “cartórios”, os lobbies e os cartéis, dispondo de fortunas aptas a comprar as mais amplas colaborações, todos exercem influência avassaladora sobre as ofensivas governamentais que visem consertar defeitos históricos das instituições, ou prover o ordenamento jurídico de instrumentos indispensáveis mas que nunca existiram, ou de expungir o mesmo ordenamento  de defeitos insuportáveis que, apesar disso, são tolerados década após década sob as mais esfarrapadas alegações.

O Brasil é tido como o país dos coitadinhos, cognome  que ganhou décadas atrás por força do livro de Emil Farhat com esse título, e dessa pecha não se livrou até hoje – ao inverso, a fama somente piorou dentre os países desenvolvidos, de cujo conjunto nos aproximamos do basalto.

No plano do trabalhismo, até há pouco tempo não existiam bons patrões nem maus empregados. Todo empregador era um escravocrata torturador e impiedoso, que só fazia espezinhar seus indefesos e santos empregados, vítimas do capitalismo selvagem e do imperialismo genocida -  e os delírios dessa ordem não tinham fim.

Sim, porque quando ser um asno ambulante, e quando  confirmado que uma mentira pronunciada mil vezes se torna uma verdade, e quando isso  dá dinheiro aos espertalhões...  ora, então por que não abiscoitar, antes de que descubram a farsa ?...

 

II – Ocorre que os lobos vestidos de cordeiro, os farsantes profissionais deitados no dinheiro que os que os ouvem lhes entregam, tiveram com a tímida reforma trabalhista de 2.017 surpresas desagradáveis, ali iniciadas emas que durante longos anos ainda continuarão a surpreender desagradavelmente.

Uma das maiores foi a obrigatoriedade de a parte perdedora nas ações judiciais arcar com honorários de sucumbência em favor da parte vencedora.

Não existiam tais honorários antes da reforma porque os  empregados invariavelmente santos, injustiçados e escravizados como sempre foram, entendia-se que não deveriam arcar com quaisquer ônus por combater a monstruosidade de seus atrozes e canibalescos empregadores... é o que rezava o diploma trabalhista máximo, criado por um demagogo ditadorzinho sulista cujo estrago ao país ainda consumirá décadas para ser de todo absorvido. Para o século XIX talvez servisse.

CLT, um diploma tão maravilhoso que cerca de 80% da matéria nem sequer os advogados trabalhistas, a esta altura da história, sabem o que significam ou o que um dia significaram.

CLT,  eis um putrefato e insepulto fóssil jurídico que auxilia, a grande, o Brasil a manter-se na dianteira dos países mais atrasados do ocidente, com suas instituições jabuticabas – as que somente existem no Brasil – que provocam riso, escárnio e desprezo por quem tenha o mínimo bom-senso institucional, e a mínima honestidade de propósito.

 

III - Pois bem, a tradicional despreocupação sucumbencial da advocacia trabalhista, que nada temia em termos de sucumbência judicial porque ela simplesmente não existia, sofreu golpe de morte com a, mesmo que  ligeira, reforma de 2.017.

O art. 791-A foi acrescido ao texto trabalhista consolidado, com a seguinte redação:

Art. 791 A   Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

§  Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.

§   Ao fixar os honorários, o juízo observará:

I - o grau de zelo do profissional;

II - o lugar de prestação do serviço;

III - a natureza e a importância da causa;

IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§  Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.

§  Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

§  São devidos honorários de sucumbência na reconvenção.

 

IV – Pelo que se lê da ordem do caput complementada pelas regras dos §§ 1º, 4º e 5º, a sucumbência é implacável: sempre atinge o perdedor da causa; aplica-se nas ações contra a fazenda pública e naquelas patrocinadas por sindicatos; aplica-se ao beneficiário da justiça gratuita que não consiga demonstrar a persistência da sua  originária situação de insustentabilidade dentro de dois anos contados do trânsito em julgado da decisão condenatória, e, por fim, aplica-se nas reconvenções (ações do réu contra o autor).

O espectro da sucumbência, portanto, é amplo e abrangente. Não foi um ensaio de instituição, nem uma simples advertência, mas constitui uma pena muito dura a quem se dá mal por brincar com ações trabalhistas – algo anteriormente lícito e, para muitos, até mesmo divertido ...

Tornou-se icônico o caso daquele infeliz trabalhador que, patrocinado por irresponsável advogado logo após a advento da reforma trabalhista, ingressou com reclamação valorada em quinze milhões de reais, mesmo sabendo que exageradamente lograria obter um quinto ou um décimo disso, perdeu em definitivo a lide e foi condenado na sucumbência mínima de 5%, ou sejam setecentos e cinquenta mil reais.

Um só parâmetro ou precedente como esse deveria desencorajar de vez toda aventura processual trabalhista, mas ao que parece restaram bastantes aventureiros quase suicidas, kamikazes processuais, que ainda desafiam a sorte como em roletas-russas judiciárias.  Não poderão reclamar do destino.

 

V - O propósito desta curta reflexão é exatamente o de, uma vez mais,  exibir a amplidão dos efeitos sucumbenciais nas ações trabalhistas.

Então, nesse sentido assim nos noticia o e. Tribunal Superior do Trabalho, no site    www.tst.jus.br  :

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho, em decisão majoritária, condenou o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil, Pesada, Montagem e do Mobiliário de João Pessoa e Região ao pagamento de honorários de sucumbência, em favor do sindicato patronal, em ação de dissídio coletivo extinta em razão da falta de comum acordo para o ajuizamento. A decisão se deu com fundamento no artigo 791-A da CLT, introduzido pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), que passou a exigir que a parte vencida pague os honorários à parte vencedora.

Extinção

O dissídio coletivo foi ajuizado contra o Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa. A entidade representante dos trabalhadores sustentou que, mesmo após sucessivas audiências de conciliação, o acordo não teria ocorrido em razão da negativa do sindicato das empresas em validar a cláusula relativa à obrigatoriedade de assistência sindical, no momento da homologação dos acordos trabalhistas. 

Diante do impasse, o Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB) acolheu a preliminar de ausência de comum acordo e resolveu extinguir o processo, sem exame do mérito. Ao negar a condenação relativa aos honorários sucumbenciais, o TRT assinalou que, no caso, a ausência de condenação, implicitamente, “reflete o entendimento de que tal verba não é devida”. Registrou, ainda, que não houve pedido de condenação nesse sentido pelo sindicato patronal, e, portanto, não estava obrigado a emitir pronunciamento sobre a matéria.

Cabimento

A relatora, ministra Dora Maria da Costa, observou que o TST, na Súmula 219, já pacificou entendimento de que os honorários são devidos “pela mera sucumbência em lides que não derivam da relação de emprego”, o que afasta a exigência de pedido expresso no recurso. 

A ministra explicou que, antes da vigência da Lei 13.467/2017, a SDC considerava incabível a condenação ao pagamento de honorários nos dissídios coletivos, independentemente de sua natureza, por entender que, nas ações coletivas, o sindicato não atuaria como substituto processual, mas como representante da categoria. Segundo ela, no entanto, o dispositivo da CLT inserido pela Reforma Trabalhista, apesar de não mencionar os dissídios coletivos, objetivou uniformizar a questão no processo do trabalho, sem fazer qualquer distinção entre as ações individuais e coletivas. E, no caso, a ação coletiva foi ajuizada após a entrada em vigor da Reforma Trabalhista.

Ficaram vencidos, no mérito, os ministros Aloysio Corrêa da Veiga, Vieira de Mello Filho, Maurício Godinho Delgado e Kátia Arruda, que votaram no sentido de negar provimento ao recurso ordinário.

Processo: 314-31.2018.5.13.0000

 

VI - Ou seja: nem sequer os dissídios coletivos afastam a condenação em sucumbência que se impõe aos sindicatos patronos das categorias em juízo, seja da ordem que for o dissídio, e seja qual for o seu objeto. Isto era impensável antes da reforma trabalhista de 2.017, e da Lei nº 13.467 daquele ano.

Ainda que não tenha havido acordo deve-se a sucumbência, já que, informa o e. TST,

os honorários são devidos “pela mera sucumbência em lides que não derivam da relação de emprego”, o que afasta a exigência de pedido expresso no recurso. 

Atenção redobrada e profunda é portanto é o que se recomenda aos abundantes paraquedistas processuais, aos atletas radicais das lides trabalhistas e aos aventureiros das audiências laborais, porque o antigo mundo do descompromisso, da  despreocupação e da intangibilidade sucumbencial  tornou-se um miasma do passado, em boa hora expungido do nosso direito.