REGISTRO DE PREÇOS (2ª E ÚLTIMA PARTE)


REGISTRO DE PREÇOS (2ª E ÚLTIMA PARTE)

Ivan Barbosa Rigolin
(set/18)



(...) 


XV - Muda-se de capítulo com o art. 4º, e fica reafirmado o âmbito exclusivo para o Executivo federal do decreto. A denominação  do capítulo já enseja ao leitor a mesma reação de uma criança à qual é apresentado seu novo remédio, o óleo de rícino. Desanima: Da intenção para registro de preços,  que não bastasse a inutilidade essencial da idéia ainda vem com a sigla IRP. Mas em definitivo  nem Estados nem, sobretudo, Municípios  têm nada com o assunto.

O art. 4º se atém aos sistemas de administração federais SIASG  e SISG, e desde logo se observa que

a) a redação do artigo deve ter preenchido o tempo de alguém desesperado para fazer alguma coisa, para trabalhar, porque a idéia toda é mais rasa que uma poça d'água e dá impressão de que nada mais havia a fazer no momento, porém  de outro lado quer parecer evoluída, complexa e eficiente,  e

b) o Executivo federal atua para que o SRP seja o mais abrangente possível para o seu âmbito institucional e organizacional, abarcando todo bem e todo serviço que  material e  juridicamente seja viável licitar por esse sistema.

Foi com isso instituído aquele procedimento, IRP,  que permite a todo ente ou órgão do Executivo federal, ou a ele institucionalmente vinculado, manifestar suas necessidades de bens e de serviços que, em seu ver, possam ser licitados pelo SRP, de modo a engrossar o bloco dos participantes do certame, quando for realizado.

Já se pode observar um acentuado burocratismo, bem próprio dos governantes em 2.013, tremendamente intervencionistas não apenas na iniciativa privada como também em seus próprios entes integrantes, similarmente ao  grande-irmão  supervisor que tudo sabe e tudo vê, e que em tudo se intromete para em geral, quase sempre,  obter os piores e os mais constrangedores resultados, muito inferiores aos pré-intervenção.

O serviço público federal evidentemente demanda complexa organização em cada uma de suas estruturas, porém o que se combate é o exagero nas de regras de procedimentos e de registros; a proliferação  de institutos artificiais de fiscalização que nenhuma falta faziam, fazem ou farão; o apetite do controle pelo controle, tudo a conduzir a autoridade, a essa altura julgando-se poderosíssima,  à doce  ilusão de eficiência - que somente ela enxerga.  Criam-se do nada problemas e dificuldades os mais variados - chifres em cabeça de cavalo -, para a seguir perseguir-se o remédio, a vacina ou o antídoto...

Assim parece ser com relação a esta IRB no SRP do SIASG e do SISG. Não serve para rigorosamente nada, porém como soam bem as siglas !...

Foi acrescido àquela insignificância geral e quase absoluta o alfanumérico § 1º - A, dando continuidade à praga legislativa alfanumérica, que permite ao legislador enfiar qualquer coisa em qualquer lugar de qualquer diploma legal. Neste caso, sendo decreto o ato,  nem o legislador é necessário. Fixa o prazo máximo de 8 dias úteis para que outros órgãos e entidades, não integrantes dos sistemas  daquelas siglas acima, manifestem interesse em participar do IRP.

XVI - O capítulo anterior, integrado apenas pelo art. 4º, dá lugar a outro que contém um único artigo. Pelo menos o autor não dividiu o decreto em livros e títulos, como ocorre no Código Civil, mas apenas em capítulos, sendo cada um dos quais, porventura e conforme já se observa, mais desprezível que um capítulo de novela de televisão.

Este uniarticulado Capítulo III fixa as competências do órgão gerenciador, que só em si já constitui uma invenção do decreto.

Nenhuma surpresa na descrição: registrar a intenção de RP por parte de quem a tiver; estimar quantidades previstas para os itens; instruir o expediente; realizar pesquisas de mercado; entender-se com os órgãos solicitantes; realizar o certame; gerenciar a ata; eventualmente renegociar preços vencedores; aplicar penalidades com garantia de ampla defesa (art. 5º, incs. I a X).

Não seria diferente - apenas não se sabendo por quê existe o órgão gerenciador, que sob essa feição lembra uma mãe responsável por todas as crianças de seu bairro. Será acaso que cada órgão federal não saberia administrar seu SRP sem a asa protetora de um órgão externo ? O intervencionismo exacerbado do governo que editou o decreto menospreza a inteligência de seus próprios componentes. 

O inc. XI desse  art. 5º, e os  dois parágrafos que o encerram, de tão desprezíveis não merecem qualquer comentário, mera parolagem flácida para dormitar bovino em que se constituem.

O art. 6º mantém o penoso clima, verdadeiro tormento para o leitor e o aplicador. Descreve as atribuições do órgão participante, em três incisos e seis parágrafos. Ressalta nítida a impressão de que o autor deve ter imaginado que fazia algo de útil ao redigir tais platitudes. Trata-se  de obviedade em cima de obviedade, sendo que a própria idéia de disciplinar o órgão participante já não tem explicação.

O que mais incomoda é o excessivo detalhismo burocrático que o decreto impõe ao ente  que simplesmente quer manter um registro de preços, como sempre fez, com relação ao órgão gerenciador, como se devesse obediência e subordinação àquele no simples ato de licitar bens para um dia comprar.  Transparece a idéia de que se o órgão gerenciador não autorizar, então ente nenhum da Administração federal realiza registro de preços...  algo rematadamente absurdo !

São felizes Estados e Municípios por não integrar esse manicômio regulamentar, como felizes serão mesmo os órgãos federais que dele puderem escapar. A regra simplesmente não faz sentido nenhum, e o e. Tribunal de Contas da União,  respeitosamente,  precisa atentar para isso. 

O Executivo atual deveria, aliás, modificar o decreto para eliminar estas inutilidades que custam e que emperram o trabalho dos entes públicos - os quais durante vinte anos mantiveram seus registros de preços sem órgão gerenciador, intenção de registro de preços e órgãos participantes, O governo federal em 2.013 inventou a roda, porém quadrada.

Com todo efeito, espera-se que os entes federais não estejam sendo presentemente submetidos a semelhante humilhação, que os degrada e lhes desestimula qualquer anseio de eficácia.

XVII - A partir do art. 7º o decreto cai em seu papel regulador, e sai de fantasmagorias como as de até este ponto - o que não quer dizer que acerte, pois a ruindade essencial das regras se mantém por alguns artigos.

O caput retrata o que hoje acontece, SRP por concorrência ou por pregão, diga o que disser a lei de licitações. A lei, ora a lei...

A regra do SRP em concorrências é naturalmente a de menor preço, e a regra de todo e qualquer pregão é obrigatoriamente a do menor preço.  Mas o caput admite SRP por pregão, e o § 1º admite SRP excepcionalmente por técnica e preço.  Será que o autor não sabe fazer contas ?  Não se apercebe da extraordinária burrice do texto ?  Como pode existir um pregão de técnica  e preço ?

A lei, ora a lei, outra vez, e a inteligência vai também de roldão.  Ora, se um SRP for para adquirir bens, então como admitir técnica e preço ?    E se  são serviços o que se licita, se estes não forem absolutamente simples também não poderão ser licitados num SRP.

E se não são simples mas complexos e exigidores de critérios mais requintados de julgamento, como o da técnica e preço, então como poderão submeter-se a um mecanismo absolutamente automático e em linha de produção como é o do SRP ?

Desobediência civil é algo muito feio. Mas como o funcionário federal poderá cumprir uma aleivosia sem pé nem cabeça como este decreto, até este momento ?

Recomenda-se à autoridade ordenadora do certame ignorar essas inviáveis admissibilidades, e  realizar apenas SRP para bens, por menor preço - nem para serviços, sejam quais forem,  nem para coisa alguma por técnica a preço.  Se um decreto autorizar o suicídio, nem por isso deve ser exercitado.

O art. 8º "autoriza"  o que a lei de licitações já autoriza há vinte anos, desde a Lei nº 9.648, de 27 de maio de 1.998, ou seja que o SRP para compras admita propostas em quantidades menores, dentro de cada item,  que a total anunciada pelo ente licitador para o respectivo item.  Em isso sendo autorizado, e em ocorrendo, o ente somará os vários quantitativos vencedores, pela ordem de classificação,  se quiser obter aquele total (máximo) anunciado.

Os preços podem nesse caso ser diversos, o primeiro vencendo com um, o segundo com outro, e assim por diante. Nem a lei nem o decreto obrigam que o edital informe que para poder fornecer os colocados seguintes ao primeiro terão de baixar seus preços até o daquele - o que seria muito curial, e que é quase uniformemente praticado.

O art. 10, entretanto e curiosamente, informa que após encerrada a etapa competitiva os licitantes poderão baixar seus preços até o do vencedor. Ora, pergunta-se por que motivo alguém, classificado com um preço maior, voluntariamente quereria baixá-lo ?   E também se pergunta: por quê aqueles licitantes já não os baixaram durante a etapa competitiva ? Esperaram a etapa acabar para só então ofertar proposta mais vantajosa ao licitador ?  Que raio de raciocínio é esse ?   Observa-se a essencial confusão mental que devia atormentar o autor do decreto anos atrás. Auguramos que a tenha superado com galhardia.

O fato é que, juridicamente podendo ou não, e de um modo ou de outro, essa redução de preço, para quem quer se manter classificado, é sempre exigida nos registros de preços, e com essa regra quase de direito natural  licitante algum se rebela.

 XVIII - Por razão didática pulamos o art. 9º, formalmente importante mas  impreciso como os artigos anteriores, e que agora será visto. Cuida dos conteúdos obrigatórios do edital para o SRP, e parece que seria exigir demais do autor que sua técnica fosse mais apurada.

Inicia (caput) por recordar que o edital para SRP obedecerá a lei de licitações e a dos pregões, e então enumera uma série de conteúdos mínimos obrigatórios, com 11 (onze) incisos. Ora, se for para atender somente a lei de licitações, só ali já existem muito mais que onze conteúdos obrigatórios nos editais de licitação...  e como resultado o aplicador do decreto, que deve redigir o edital, acaba com três roteiros obrigatórios, um a atravessar  o outro.  Grande técnica !..

Já a  esta altura, a orientação é a de seguir antes a lei e depois, se sobrar tempo e nada mais houver a fazer, então ver o que diz o decreto. Referimo-nos à  de licitações, pois que a do pregão é um zero à esquerda de tudo, não dizendo absolutamente nada sobre esse assunto.

Os onze incisos deste art. 9º  ou repetem a lei ou dizem obviedades variadas, uma após a outra. O que o edital precisa efetivamente é:

a) fixar a quantidade máxima de cada item, para orientar o licitante sobre o máximo que durante a vigência da ata poder-lhe-á ser exigido. A quantidade mínima é sempre zero em registro de preços;

b) se o edital admitir cotação de parte da quantidade máxima estimada para cada item, informar qual é esse mínimo, abaixo do qual qualquer proposta será ipso facto desclassificada;

c) o prazo de validade do registro de preços, que, se não for de um ano, constituirá um exercício da pouca inteligência da autoridade, algo como a atitude do cidadão que bate continuadamente uma porta em sua cabeça, e indagado por que o faz responde: - é tão agradável quando eu paro ! Poder fazer valer a ata por um ano e fazê-la valer menos é abstruso, ou sesquipedal como para Monteiro Lobato no seu O colocador de pronomes;

d) planilhas de custos e minutas de contratos - e por essa última locução o autor do decreto deve estar se referindo a modelos de atas. Melhor não contrariá-lo. As planilhas servem para orientar os interessados sobre as expectativas de preços do ente licitador, e as minutas de atas  para informá-lo sobre o barco em que pisará se vencer algum item do certame. E já nesse passo não se imagina para quê foi escrito o inc. X;

e) penalidades. Por mais claro que isso possa parecer nas leis, de fato não é tão clara a previsão, e faz bem o edital em esclarecer, dentro dos máximos legais, as penas a que se sujeita o detentor de atas por qualquer espécie de inadimplemento.

A restante matéria desses onze incisos são mais gratuitas que o sorriso de uma criança, ou que o vôo do colibri na manhã radiante. De nada servem nem nada dizem, exceto, talvez, para o indecifrável autor.  Só para exemplificar veja-se o inc. X(, que manda ao edital obrigar a  "realização periódica de pesquisa de mercado para comprovação da vantajosidade".  

Quem deve realizar pesquisa, o licitante, detentor da ata ?  Será que isso realmente está escrito ?  Custa crer, e mais ainda custa crer que um dia o governo federal brasileiro imaginou poder submeter o funcionário federal a uma bestialidade desse porte.   O dispositivo é asinino, e envergonha a nacionalidade.

Os quatro parágrafos deste art. 9º - e não se lamente, eis que poderiam ser em maior número -  de relevante contêm tão-só: a) o menor preço de critério pode referir-se a maior desconto sobre tabelas adotadas pelo edital, e  b) poderá haver cotações diferentes, pelo mesmo proponente,  para locais diferentes de entrega ou de prestação, tanto para bens quanto para serviços.  Ambas as regras são lógicas e razoáveis, mas nada mais nos parágrafos  merece mínima  atenção.

 XIX  - O art. 11 abre o Capítulo VI, relativo ao registro e à validade da ata.

Filtrando-se a sua redação, prescreve que após a homologação do certame serão registrados na ata os preços do vencedor (inc. I); que se registrarão também os licitantes que aceitarem cotar ao mesmo preço do vencedor, pela ordem de classificação, apara formar o cadastro de reserva  (inc. II e § 1º); que os preços s registrados serão divulgados no portal de compras do governo federal (III), e que a ordem de classificação será observada nas contratações (IV), como se pudesse ser diferente.

Seguem quatro parágrafos, o primeiro já mencionado e que serve para convocar classificados que não o vencedor, em caso de algum impedimento deste, ou escusa em fornecer. O § 2º indica o critério desempate em caso de haver mais de um proponente naquela situação, e é em favor de quem apresentou a última proposta na fase competitiva. 

O § 3º repete o óbvio apenas para confundir, e é conveniente esquecer que está escrito.  O § 4º, c que como os demais foram acrescidos ao decreto do SRP por força do Decreto nº 8.250, de 23 de maio de 2.014,  enseja aprofundadas lucubrações metafísicas sobre a inutilidade humana: será que com efeito alguém do governo federal de então, 2.014, imaginava realizar algum trabalho em prol do seu semelhante ?  Em que planeta vivia ?

O art. 12, que fecha o capítulo, no caput apenas repete a lei de licitações ao informar o prazo máximo de validade máximo de um ano para a ata do SRP, inclusas eventuais prorrogações caso a validade tenha sido menor - e  já dissemos que fixar em menos de um ano a validade equivale a se bater repetidamente uma porta na cabeça, pensando-se na deliciosa sensação de alívio  que a cessação dessa atividade propicia.  Quem fixa a ata do SRP em menos de um ano é provido dessa mesma escassa inteligência.

O § 1º impede aos funcionários sujeitos  a este decreto exercer um direito que a lei de licitação, art. 65, § 1º, dá à Administração, que é o de exigir até 25% a mais ou a menos dos quantitativos licitados, aos respectivos detentores das atas. É que, sendo o registro de preços não um contrato de compra mas um pré-compromisso de eventual fornecimento,  o Executivo federal visou permitir ao detentor de cada  ata ter segurança quanto às quantidades máximas que lhe poderão ser exigidas. 

Compreende-se portanto a regra, e neste caso o decreto funciona como mera ordem hierárquica, como no dizer do mestre Geraldo Ataliba ao ensinar que decreto somente obriga funcionário.

O § 2º é de excelente qualidade, por interpretar corretamente a lei de licitações no estabelecimento da regra para a duração do contrato decorrente de uma ata de registro de preços.

Não se confunda o prazo máximo de validade da ata, com o prazo máximo de validade do contrato proveniente da ata.  São tão iguais quanto marmelada e amortecedor de colheitadeira.  Uma bobagem como esta deve ter sido produzida pela pressa em compreender a lei, e o açodamento em aplicá-la como à primeira vista pareceu necessário.

Nada disso. Muito corretamente este § 2º remete a duração do contrato aos dispositivos da lei de licitações que regem essa matéria, que são o art. 57 e suas subunidades, e não ao dispositivo da mesma lei relativo à validade máxima da ata, que é o art. 15, § 3º, inc. I.  Esse último só se aplica à duração da ata, jamais à do contrato que dela se origina.

Assim, pode perfeitamente ser extraído um contrato de fornecimento com duração de cinco anos, diretamente da ata do SRP, como o pode ser  um contrato de serviços contínuos que estejam registrados em alguma ata.  A validade daquela ata pode já haver expirado há anos, porém o contrato que dela se originou continua em vigor até seu termo final, porque a mantença desse contrato  não depende da validade da ata - desde que o contrato tenha sido assinado durante a validade da ata, como informa o § 4º deste art. 12, e como de resto manda a mais primária lógica.  Não se concebe assinar um contrato derivado de uma ata de SR que esteja vencida.

Os contratos derivados do SRP têm duração regida pelo art. 57 da lei de licitações, sem qualquer alteração ou diferença apenas porque derivaram do SRP.  E o § 3º manda aplicar a esses contratos também o art. 65 da lei de licitações, que se refere, entre mais disposições, à alterabilidade unilateral pela Administração.

 Curioso, porque então se aplica apenas o restante do art. 65, sem o § 1º, de acordo com o que reza o § 1º deste art. 12. Ou seja: alterações do contrato são aceitas, mas não aquelas devidas a acréscimos ou reduções do objeto (L. 8.666, art. 65, § 1º). 

Desse modo, se a Administração aumentar os quantitativos contratados com base no art. 65, I, b, o que a teor do § 3º deste art. 12 pode fazer, como se explica a situação ?  Pode aumentar quantidades e valor com base num dispositivo do art. 65 (inc. I, al. b), mas não pode aumentar com base em outro  (art. 65, § 1º)  ?

Ora, mas que tremenda incongruência do decreto, porque aumentar quantitativo é aumentar quantitativo...  não importa com base em que dispositivo ! 

O excelente § 2º deste art. 12 vem em seguida ao péssimo  § 1º, e com isso o § 3º, sem saber para que lado olhar, resta sem muita lógica.

Diante disso, o que se recomenda é, sempre que for preciso aumentar o quantitativo contratado, fazê-lo cinicamente com base no inc. I, al.  b, da lei de licitações, e nesse dispositivo fundamentar formalmente a alteração do contrato.  Não se recomenda ao aplicador adotar espertezas na sua profissão,  porém  quando o texto é excessivamente burro devem ser aceitas para se evitar prejuízo maior. É questão de sobrevivência...

 XX - O art. 13 manda que o ente público convoque o vencedor para assinar a ata, após sua homologação, no prazo que assinala, prorrogável uma vez a critério do mesmo ente. Caso ele não compareça pode a Administração convocar apenas o segundo classificado, ou já diretamente todos os demais classificados e sempre pela ordem de classificação, para que, se quiserem e nas condições do vencedor que não compareceu, assinar a ata, e se comprometerem nos seus termos.

O art. 14 reafirma o compromisso que a assinatura da ata implica, e determina a aplicação de penalidades ao vencedor que se recuse a assinar a ata - assim é que se deve ler a pouco clara redação de algo aparentemente tão simples. Sim, porque não é admissível aplicar penalidade a quem se recuse a reduzir seus valores propostos no certame até os do vencedor, já que licitante algum é obrigado a isso.

O art. 15 manda a que a contratação derivada do SRP seja formalizada por instrumento contratual específico, dentre aqueles constantes da lei de licitações, art. 62, ou mesmo outros que acaso existam em cada ente público. Vale dizer: por essa técnica a ata não é contrato algum, mas compromisso de contratar se o ente licitador demandar o fornecimento. O contrato tem de ser específico, ainda que por instrumento simplificado.

O art. 16 repete o § 4º do art. 15 da lei de licitações, sendo portanto tão útil ao direito como o é a pedra na sopa da fábula popular, ou como, voltamos a citá-lo, o soprador de verrumas do conto A vingança da peroba, do inigualável gênio da literatura brasileira, José Bento de Monteiro Lobato.

O direito brasileiro há de melhorar no dia em que o Executivo finalmente aceitar a regra de que regulamentos não devem repetir as leis a que servem, tanto porque a lei não precisa de regulamento que a repita para valer, quanto porque mesmo sem decreto a lei precisa ser cumprida como está escrita, nada representando para o direito o decreto repetidor.

 XXI - Os arts. 17 a 21 constituem o Capítulo VIII, sobre revisão e cancelamento dos preços registrados.

O art. 17 apenas informa genericamente que os preços registrados poderão ser revistos, em função de variação dos preços praticados no mercado, e somente esse artigo, isoladamente considerado, pouco diz ao direito.

O art. 18 operacionaliza a hipótese do artigo anterior, informando que se os preços do mercado caírem abaixo dos preços registrados, o órgão gerenciados na União - ou, dizemos nós, quem lhes faça as vezes como gerenciador do RP nos entes locais - convidará os detentores das atas, tanto os vencedores quanto os demais classificados se o ente quiser,  a reduzirem seus preços de modo equivalente; em caso de recusa serão liberados de seus compromissos, e a ata  cancelada como adiante prevê o art. 20, inc. III.

Não entendemos inteligente esse convite genérico e antecipado à redução de preços, porque nada assegura que os mesmos preços se manterão reduzidos no mercado, e com isso um grande esforço de parte a parte pode ver-se frustrado pelas oscilações do mercado. Parece muito mais razoável, em o ente observando que no mercado os preços ficaram menores que os seus registrados, convidar o detentor da ata para reduzir seus preços especificamente para a ocasião, e então contratar sob essa nova condição.  A bola de cristal e os jogos de adivinhação não devem orientar os procedimentos negociais da Administração.

O art. 19 de certo modo repete o art. 18, neste confuso capítulo que parece repetir os artigos, sem qualquer motivo plausível. E o seu parágrafo único contém a estranha ordem de revogar a ata caso o ente não obtenha as reduções pretendidas, o que é uma rematada insânia na medida em que a revogação é sempre um direito, ainda que condicionado à existência de motivo, mas nunca uma obrigação.

 É o dedo intervencionista e tutelador do governo central, fracassado miseravelmente em todos os lugares do mundo e que tanto atrasou e atrasa os países, o mesmo que trata as autoridades como incapazes que brincam de administrar.

O art. 20 informa que o RP será cancelado nas quatro hipóteses que enuncia - e não escapa de conter impropriedades, como é a sina deste regulamento.

A primeira hipótese (inc. I) é a de descumprimento das regras da ata pelo detentor, o que, assim enunciado,  é natural; apenas se atente para que o gerenciador deve  aplicar seu  tirocínio a cada caso, e apurar se o descumprimento é tão grave que enseje o cancelamento ou se não chega a tanto, hipótese em que a ata não deve ser cancelada, sem embargo da aplicação de alguma penalidade.

O inc. II prevê - com redação deplorável, que neste momento higienizamos - que será cancelado o RP do detentor da ata que, injustificadamente,  se recusar a contratar quando convocado dentro das condições do mesmo RP.  Será justo o motivo que simplesmente seja aceito pelo ente, e injusto aquele que não o seja, inexistindo parâmetro mais objetivo para conduzir esta questão.

O inc. III apenas complementa o sentido do § 1º do art. 18, como já se viu.

O inc. IV engrossa o caldo ao estabelecer que será cancelada a ata do detentor que sofra suspensão do direito de c licitar e contratar com a Administração (lei de licitações, art. 87, inc. III), ou seja declarado inidôneo (idem, inc. IV).  Quanto ao inc. IV está correta a previsão, mas absolutamente errada quanto ao inc. III, porque jamais a suspensão do licitante poderá implicar o cancelamento de uma ata que, imagina-se, vale por um ano, já que apenas impede que o ente público o convoque, dentro do prazo da suspensão, para fornecer.

Nem mesmo no caso de a suspensão ser superior à validade da ata se justifica o cancelamento, porque é sempre possível ao suspenso obter judicialmente  a suspensão ou mesmo o cancelamento da penalidade, e não é inteligente mover todo um processo contraditório de cancelamento da ata com um fundamento que pode ser anulado em juízo.  Basta não convocar o suspenso para fornecer durante a suspensão, sem necessidade de se anular sua ata.

E durante a suspensão pode o ente convidar o segundo colocado, nas condições do primeiro que está suspenso, a fornecer. porque a suspensão de um fornecedor não pode paralisar o ente público.

O parágrafo único informa que o órgão gerenciador - para quem tem o azar de se submeter a esse politburo - será o responsável pela formalização do cancelamento, como se um decreto federal precisasse dispor sobre isso.

O art. 21, fechando o capítulo, anuncia que o RP poderá também ser cancelado por caso fortuito ou força maior, justificados e prejudicais ao cumprimento da ata, nas hipóteses de haver interesse público ou a pedido do fornecedor. Ocorrendo caso fortuito ou força maior, de suficiente impacto na ata, evidencia-se desde logo a razoabilidade do dispositivo, eis que em tais condições poderia resultar até mesmo impossível a manutenção da ata.

 XXII - Agora, com o art. 22,  o nível técnico do regulamento atinge o fundo do poço. E a tragédia piorou recentemente, com grandes acréscimos alfanuméricos a este pavoroso  art. 22, pelo Decreto nº 9.488, de 30 de agosto de 2.018, como se o artigo inteiro merecesse o mínimo respeito, como não merece. O novo decreto espraiou-se sobre matéria juridicamente putrefata, como se tivesse condão de melhorar aquela calamidade que é o carona.

Trata-se, enfim, do carona, infelicíssima idéia do Executivo federal em um estertor de mandato, que se reveste de toda ilegalidade que se possa reunir em pouco espaço, e que de nós merece o desprezo mais sincero e espontâneo de que somos capazes.

Outra dessas idéias que têm em vista somente a praticidade - e a lei, ora, a lei... -, o carona vem e sendo proscrito, rejeitado e estigmatizado por entes como o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, e muitos conhecidos Tribunais de Contas estaduais,  de modo enfático e decidido, no que merecem elogio incondicional.

Sem base nenhuma na lei de licitações, cuja sistemática é inconciliável com essa sinistra instituição porque se trata de invenção extraída de cartola de mágico para quebrar o galho de órgãos públicos federais - em geral não muito afeitos ao trabalho -, o que se recomenda a Municípios (já que  falar aos Estados ou à União é como falar às paredes), e até em seu proveito com vista à futura fiscalização pelos TCs, é jamais utilizarem o carona, em hipótese alguma, para o objeto que for, sob nenhuma alegação, pretexto ou evasiva. 

Nada justifica revogar a lei de licitações e o mandamento constitucional que manda aos entes públicos licitar, apenas porque um dia o sr. presidente da República, por seguro pessimamente assessorado, inventou um atalho operacional que atropela a lei. Deve ter agradado alguns servidores, mas desagradou profundamente os cultores do direito e o próprio direito.

O carona merece todo rigor reprobatório do Tribunal de Contas da União com relação aos entes que fiscaliza. Contas oriundas do carona  merecem reprovação sempre.

Tão irresponsável e leviana é a instituição que logo ao eclodir na União ensejou aos espertalhões de plantão, desses que vendem terrenos na lua ou loteiam o vale do Anhangabaú ou o parque do Ibirapuera em São Paulo,  ou a esplanada dos Ministérios em Brasília, simplesmente passaram a vender autorizações a alguns Prefeitos, simplórios até o imperdoável, para que adotassem ou aderissem a registros de preços de outros Municípios, com ou sem o conhecimento desses últimos.   Um trabalho exemplar de civilidade e evolução institucional, como se percebe. 

E não se estranhe tanto: uma picaretagem  como o carona enseja picaretagens semelhantes.

Todo o art. 22 parte do pressuposto da legalidade e da legitimidade do carona, e assim todo ele se revela rigorosamente imprestável para quaisquer fins de direito.

O Executivo federal precisa revogar essa infâmia antijurídica com urgência, pois que o estrago que provocou já foi grande o suficiente até este momento.  O melhor destino dos rejeitos e das escórias, sejam do que  forem,   ainda é... o fogo.  Não é sem razão que os prudentes nunca dão carona a seres estranhos.

O decreto de 2.018 acresceu os §§ 1º-A até 4º-A, e depois disso os §§ 9º-A até 11   ao art. 22.  Não os comentaremos  porque todo o artigo não vale o papel em que foi escrito, e se tivesse 100 parágrafos continuaria não valendo, pois que cria um mundo à parte do direito que não resiste a qualquer análise de legalidade.  Comentar algo assim significaria no mínimo dar um passo no sentido de coonestar esta infâmia antijurídica, que deveria ser raspada com estilete do decreto  e não incrementada como foi pelo decreto de 2.018.

Somente o que humildemente se volta a recomendar a todas as autoridade, inclusive  federais,  é que não se utilizem do carona nem  deste nauseabundo art. 22, nem nele se inspirem se em seus entes locais, por tudo o que acima se disse.

E também fazemos votos de que os Tribunais de Contas, todos no Brasil, continuem julgando irregulares os contratos celebrados com base no carona, e prossiga declarando-os nulos e aplicando penas aos responsáveis até o dia em que o último deles se convença de que não deve  pedir carona licitatória a outros entes.  Carona serve para saltimbancos de beira de estrada.

XXIII - Superado o baixíssimo território do carona, entra o decreto em disposições finais e transitórias.

O art. 23 custa crer que possa ter sido escrito em 2.014, pois que informa que os SRP poderá ser informatizado. Dever-se-ia talvez informar o autor que o homem já foi à lua.

O art. 24 é transitório e já perdeu sua função até no máximo 2.015.

O art. 25 e o art. 26 são também transitórios e já devem ter esgotado sua função. Referem-se ao portal de compras do governo federal, que cinco anos após editado o decreto já deve ter se adequado ao SRP - até porque se não o fez até agora deve revestir-se da mais rematada inutilidade.

O art. 27 informa que o Ministério do Planejamento poderá edital normas complementares a este decreto, (I) o que sempre faz, (II)   o que não precisaria propriamente de autorização  governamental e (III) o que somente reafirma que o governo central se achava indispensável para fiscalizar cada passo até de seus escalões superiores, inspirado como estava na KGB, no kuomintang, no comité central ou no politburo orientais, tão caros àqueles governantes.

O art. 29 revogou expressamente os dois decretos anteriores sobre o SRP, nºs 3.391, de 2.001, e 4.342, de 2.002.

Esse, em resumo, é o Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2.013, que disciplina o SRP no plano do Executivo federal.  Não representa evolução alguma na técnica regulamentar, revelando-se intervencionista ao extremo, burocratizante até mais não poder e, com essas características, provavelmente prejudicial ao ritmo do serviço no escalão federal.

Algo como uma corrida de obstáculos ou de barreiras, institui organismos e instâncias artificiais, como quem inventa a roda, tão desnecessárias que o SRP existe e funciona perfeitamente  no país ao menos desde 1.972, sem nada semelhante a este decreto.

A Estados e a Municípios se recomenda por isso a mais segura distância deste regulamento, cuja inquestionável virtude é ter dado a correta interpretação da lei quanto a duração de contratos oriundos de registro de preços, no art. 12, § 2º, e pouco mais que isso.

 XXIV - O SRP pode ser exercitado através de pregões, tanto o presencial quanto o eletrônico, e o é com avassaladora freqüência, quase mesmo se podendo afirmar que essa é regra.

A exigência, do art. 15, § 3º, inc. I, da lei de licitações, de que o SRP se dê apenas por concorrências, como se disse retro,  hoje é tida como piada nos círculos do serviço público.  mesmo que a lei de licitações continue hígida e plenamente em vigor.  É que o Brasil, ante a lentidão do processo legislativo,  instituiu a modalidade de revogação tácita por desuso  de leis que se tornem inconvenientes ou obsoletas. É o país do futuro.

Não existem maiores inconveniências no pregão pra realizar licitações para registro de preços, senão as próprias do pregão, vale dizer: não é por ser SRP         que o pregão é inconveniente: o pregão é conveniente ou inconveniente pelas suas características próprias, independentemente do objeto em jogo, seja um registro de preços, uma compra de beterraba triangular ou um serviço qualquer. Não é o registro de preços que implicará conveniência ou inconveniência ao pregão.

O que se recomenda até com ênfase sempre que existe a contingência de se realizar um pregão, é que se o prefira preferencial  e não eletrônico.  

O eletrônico, em virtude da impessoalidade dos licitantes atrás de uma tela de computador e que não se sabe sequer se existem, ou quando se sabe que existem não se sabe se de fato são eles que estão ali participando ou fantasmagorias as mais variadas,  está sujeito a tantas e tão diversas vicissitudes como fraudes, falsidades, mentiras, golpes, e tudo mais que a criminalidade humana possa conceber.

 Neste país de saqueadores de cargas, que falsifica  até o produto com que se adultera a gasolina, que em uma semana falsifica o selo holográfico que os cartórios instituíram para evitar falsificação de atos cartoriais, ou ainda que institui uma delegacia de polícia-pirata  em pleno centro de São Paulo nos idos de 2007;  neste nosso país dotado de altíssimo índice de criminosos de toda espécie, se numa própria licitação presencial toda sorte de golpes já acontecem com espantosa freqüência, que então dizer de raposas escondidas  atrás de aparatos eletrônicos ?

Repita-se: não é por licitar registro de preços que o pregão eletrônico é ruim, mas porque  não presta mesmo, nunca, para nenhum objeto. Se um dia servir aos bons propósitos de quem o concebeu, ótimo, é o que se anseia. Mas neste momento o acampamento de ciganos  que ainda é nosso país não o recomenda.

 XXV - Para concluir formulemos algumas breves recomendações à autoridade que manda licitar.

É sempre uma boa idéia verificar, a cada registro de preços que se pretenda realizar, se é caso de o edital permitir a cotação de quantitativos menores que o total anunciado pela Administração como o máximo que poderá exigir do vencedor de cada item, ao longo da validade da ata ou do contrato que dela resulte.

Tal medida sempre aumenta a competitividade, pois que muitos fornecedores podem temer propor em uma licitação que lhe possa exigir quantidades para ele imensas de algum item, que ele prudentemente não está certo de que poderá obter se demandado.

Se puder esse licitante propor até uma quantidade menor que aquele total, sentir-se-á por certo mais seguro, e com isso mais participantes é o que se espera em um tal certame. A competitividade aumenta naturalmente, fácil é concluir.  E se ao invés de um só contrato resultarem vários, a gestão também terá de dividir-se, mas esse incremento de trabalho possivelmente compensa em termos operacionais para o ente licitador, ante preços melhores que poderá registrar  se as quantidades não forem disponíveis apenas por poucos,  ou por muito poucos, fornecedores.

Outra recomendação é a de que,  ainda que se licitem numerosos lotes, o ideal é que cada um deles seja integrado por apenas  um ou poucos itens, já que quanto maior for o conjunto de  itens diferentes, mais difícil será obter fornecedores que disponham de todos  para fornecer. Outra vez a questão é de tentar aumentar a competitividade, além de se racionalizar ou simplificar o exame de cada lote oferecido.

Por fim, indica-se à autoridade a vantagem de se celebrarem contratos os mais longos que a lei de licitações permite, no art. 57, relativamente a fornecimentos ou serviços licitados por registro de preços.

Se a regra legal permite contratos como por exemplo de cinco anos (serviços contínuos), e se porventura o ente licitador conhece o prestador e a qualidade do seu trabalho, e se sabe que ele serve perfeitamente o interesse do mesmo ente, então não se imagina por que motivo o contrato seria menor que o máximo permitido.

Tenha-se sempre presente que a duração do contrato não precisa coincidir ou se encerrar com o fim da validade da ata do registro de preços, podendo superá-la em muito, conforme autoriza o art. 12, § 2º, do decreto, que nada faz senão ler corretamente a lei de licitações.