Artigo
1) COOPERATIVAS; 2) ANÁLISE DE RISCO; 3) FRACIONAMENTO DE OBJETOS: ENFOQUE DA LEI Nº 14.133/21
1) COOPERATIVAS; 2) ANÁLISE DE RISCO; 3) FRACIONAMENTO DE OBJETOS: ENFOQUE DA LEI Nº 14.133/21
Ivan Barbosa Rigolin
(jul/22)
Estes são três temas dentro do cada vez mais imenso mundo das licitações, dois dos quais são tradicionais na legislação e um – análise de risco – a constituir novidade da Lei nº 14.133/21.
Um problema que talvez se pudesse propor aos astrofísicos e aos perscrutadoRes do universo é o de indagar que realidade cósmica se expande mais: o universo propriamente dito ou o universo dos temas de licitação, ante a nova lei brasileira.
Devido entretanto à preocupação com a dignidade da ciência astronômica e com a possibilidade de ela vir a ser subitamente humilhada pela concorrência licitatória, não vamos a fundo naquela inquirição apenas sugerida.
Esta é uma breve análise do modo como a nova lei de licitações equaciona os três temas do título.
COOPERATIVAS
I – Este assunto deu muito o que falar até tempos bem recentes, e muito pano para manga aos comentaristas.
As sociedades cooperativas, beneficiadas como são por regime tributário diferente do das empresas comerciais clássicas, venciam licitações com relativa facilidade em face do seu menor custo operacional, algo que bem cedo chamou a atenção do mercado.
Desde logo se dividiram e se separaram (I) os favoráveis incondicionadamente à participação de sociedades cooperativas em licitações, sem qualquer embargo ou requisito, daqueles (II) favoráveis condicionadamente à participação, desde que para tanto fossem atendidos certos requisitos, e ainda daqueles (III) completamente desfavoráveis, que alegavam privilégios ilegítimos e anti-isonômicos às cooperativas, em face da sua natureza peculiar.
Perfilhamo-nos inicialmente no primeiro grupo, favorável à participação incondicionada, sempre entendendo que todos têm direito de montar cooperativas, se elas são tão privilegiadas e atrativas como alegam os contrários.
Nada nem ninguém proíbe que se constituam novas cooperativas, como no episódio do ovo de Colombo. Ao invés de reclamar do sucesso alheio, todos podem sair da zona de conforto, arregaçar as mangas, assumir os riscos da iniciativa, investir na ideia e formar cooperativas.
II – Ocorre entretanto, neste país onde a fraude, a empulhação, o golpismo desenfreado, o embuste, a picaretagem e a mais generalizada má-fé atingem patamares inigualávelis no planeta ([1]), que desde sempre os estelionatários e os paraquedistas do comércio aprenderam a fabricar ‘cooperativas’ tão legítimas e confiáveis quanto uma nota de reze unidades monetárias, ou uma placa de automóvel grafada Ção Paulo.
De cooperativas nada tinham aquelas pessoas jurídicas, pois que apenas empregavam trabalhadores e profissionais de cada área respectiva, os quais quando designados para algum serviço simplesmente trabalhavam para o seu empregador, sem nenhum liame com o cooperativismo e, muita vez, sem sequer saber o que é isso.
O Judiciário, provocado, chegou a intervir intensa e decisivamente naquela iníqua e espúria relação comercial, apostrofando falsas cooperativas – empresas comuns prestadoras de serviço com apenas fachada de cooperativas – e fazendo por manter as coisas em termos juridicamente corretos e adequados.
Nessa hipótese não é só em si irregular o fato de que uma sociedade formalmente constituída como cooperativa participe de alguma licitação; ocorre que se for declarada judicialmente uma falsa cooperativa, uma fraude comercial que nada tem de cooperativa que presta serviçsos aos associados mas que em verdade é uma empesa comum pestadora de serviços no mercado indiferenciado, então o problema reside aí, e ela está encrencada mesmo fora de qualquer licitação. E como cooperativa não poderá concorrer.
Não é a licitação que deve apontar fraude em curso – porque isso simplesmente não interessa a uma licitação -, mas sim uma investigação, em geral iniciada por denúncia de alguém, ou mesmo uma ação judicial, que a desmascarará só em si, mesmo fora de qualuer certame licitatório.
Licitação não é investigação civil nem criminal: ou a falsa cooperativa é desmascarada pelos meios jurídicos hábeis ou, se não o for, então poderá participar do certame, vencê-lo e ser regularmente contratada pelo órgão público licitador.
Não se propugna pela imoralidade, porém cada coisa deve manter-se no seu lugar, e se o ente licitador não consegue detectar os golpes que contra ele intentam, então engula o resultado.
III – Atenta à questão das falsas cooperativas, e de modo inédito na lei geral de licitações, assim dispôs a Lei nº 14.133/21 sobre a participação das cooperativas nas licitações:
Art. 16. Os profissionais organizados sob a forma de cooperativa poderão participar de licitação quando:
I – a constituição e o funcionamento da cooperativa observarem as regras estabelecidas na legislação aplicável, em especial a Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, a Lei nº 12.690, de 19 de julho de 2012, e a Lei Complementar nº 130, de 17 de abril de 2009;
II – a cooperativa apresentar demonstrativo de atuação em regime cooperado, com repartição de receitas e despesas entre os cooperados;
III – qualquer cooperado, com igual qualificação, for capaz de executar o objeto contratado, vedado à Administração indicar nominalmente pessoas;
IV – o objeto da licitação referir-se, em se tratando de cooperativas enquadradas na Lei nº 12.690, de 19 de julho de 2012, a serviços especializados constantes do objeto social da cooperativa, a serem executados de forma complementar à sua atuação.
Dessa forma o berreiro, o ranger de dentes, as imprecações de morte e os ódios entrecortados que a presença de cooperativas até hoje provocou entre os licitantes não-cooperativos durante os certames licitatórios tende a ser equacionado, e o combate às falsas cooperativas deve ser tornado objetivo e racional.
Deixa de ser uma rinha de galo como foi até hoje – com possíveis peixeiradas, pontapés, dedos no olho e gravatas mata-leão entre o costumeiramente refinado conjunto dos licitantes -, e se torna uma seleção civilizada e transparente.
Mas para tanto o ente licitador precisará exigir, na habilitação, o contrato social ou o outro constitutivo que lhe faça as vezes, do qual examinará o atendimento aos requisitos da legislação cooperativa, inabilitando as coopertavas que não os atendam, por assim dizer tentem dar nó em pingo d´água.
Se o objeto da licitação se enquadrar dentre os das cooperativas de trabalho regidas pela Lei nº 12.690/12, então adicionalmente precisará o ente licitador verificar a sua compatibilidade com a do objeto da cooperativa de trabalho que se apresente ao certame, inabilitando as de objeto incompatível.
Advirta-se que nem sempre é simples ou objetiva a análise de compatibilidade entre objeto da licitação e objeto da cooperativa, mas precisará ser ensejada de algum modo.
Nada mais parece exigível quanto à demonstração de adequação entre a cooperativa que se apresente ao certame. Outras habilitações, de outras naturezas, naturalmente existirão, mas não dizem respeito a essa específica demonstração.
A questão das cooperativas está, na nova lei, muito mais parametrada, portanto, do que nunca esteve sob as leis nacionais anteriores dde licitação.
ANÁLISE DE RISCO
IV – A lei nº 14.133/21 contemplou matriz de alocação de riscos como uma possível previsão do edital, nestes termos:
Art. 22. O edital poderá contemplar matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado, hipótese em que o cálculo do valor estimado da contratação poderá considerar taxa de risco compatível com o objeto da licitação e com os riscos atribuídos ao contratado, de acordo com metodologia predefinida pelo ente federativo.
§ 1º A matriz de que trata o caput deste artigo deverá promover a alocação eficiente dos riscos de cada contrato e estabelecer a responsabilidade que caiba a cada parte contratante, bem como os mecanismos que afastem a ocorrência do sinistro e mitiguem os seus efeitos, caso este ocorra durante a execução contratual.
§ 2º O contrato deverá refletir a alocação realizada pela matriz de riscos, especialmente quanto:
I - às hipóteses de alteração para o restabelecimento da equação econômico-financeira do contrato nos casos em que o sinistro seja considerado na matriz de riscos como causa de desequilíbrio não suportada pela parte que pretenda o restabelecimento;
II - à possibilidade de resolução quando o sinistro majorar excessivamente ou impedir a continuidade da execução contratual;
III - à contratação de seguros obrigatórios previamente definidos no contrato, integrado o custo de contratação ao preço ofertado.
§ 3º Quando a contratação se referir a obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital obrigatoriamente contemplará matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado.
§ 4º Nas contratações integradas ou semi-integradas, os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto básico pelo contratado deverão ser alocados como de sua responsabilidade na matriz de riscos.
O primeiro a observar e ter presente é que aquela matriz de riscos, salvo na hipótese do § 3º deste artigo - obras ou serviços de grande vulto, ou contratação integrada ou semi-integrada - é uma faculdade que a lei confere ao edital, jamais, em nenhuma hipótese, uma imposição.
Exceto naquela rara e pouco comum hipótese, nenhum edital, nenhum ente público, nenhuma pessoa licitadora está jamais obrigada a contemplar aquela matriz, a qual, na esmagadora maioria das vezes, simplesmente não faria sentido, sendo tão útil quanto um bom desastre de bicicleta, ou uma repentina febre tifóide ([2]).
V - Faz sentido a idéia da matriz de riscos sobretudo nas licitações para concessão de serviço ou nas concessões de obra pública que se licitam, nos quais contratos os riscos econômicos, financeiros e operacionais – e mesmo políticos - para ambas as partes são imensos e importantíssimos; uma tentativa de equacioná-los racionalmente há de sempre ser bem-vinda, e uma atenta matriz de alocação de riscos poderá auxiliar à grande. Trata-se simplesmente de tentar reduzir o risco até um patamar relativamente sob controle, o chamado risco calculado.
Acontece que, uma vez mais, a lei autorizou o que nunca foi proibido, e o que sempre foi lícito e admitido em qualquer ocasião, e em qualquer edital. Se a nova lei não tivesse previsto essa matriz de riscos ela seria tão lícita e admissível quanto o foi sempre, sem qualquer embaraço: basta o edital contemplar aquela matriz.
Nenhuma autoridade jamais esteve proibida de incluir nos seus editais algo como uma matriz de riscos, e mesmo hoje, antes da entrada em vigor exclusivo da nova lei, continua livre para fazê-lo, se for o caso já para o edital da semana que vem.
VI – Existem regras para a elaboração da matriz de riscos ? Não. Os seus conteúdos podem variar a de a a z, e ser os mais diversos possíveis, tanto em forma quanto em conteúdo material.
Cada autor de edital, naturalmente assessorado por profissionais do ramo, montará a matriz que bem entenda adequada: o mercado dos licitantes, em caso de inconformismo, impugnará o edital e lhe apontará os defeitos que então alegue, requerendo correção e adequação. Imagine-se, então, o duelo de subjetivismos que de parte a parte se terçarão...
Não está afastada a ideia de se contratar a elaboração da matriz de riscos a terceiros, e para essa hipótese não se vislumbra licitabilidade ante a natureza peculiar e a singularidade desse trabalho - respeitando-se entendimentos diversos ([3]).
FRACIONAMENTO DE OBJETOS
VII – Pinçou-se este tema, aparentemente fora de contexto e que não corresponde a nenhum tipo infracional expresso na lei – pode estar subsumido, mas não está expresso – para se tentar refrear um pouco o moralismo de circo dos agentes e dos doutrinadores que se consideram e se sentem os guardiões permanentes da Administração pública brasileira.
Passada a onda da “improbidade culposa” com a hipocrisia nacional tendo sofrido um golpe de morte (Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2.021), eis entretanto que a nova Lei nº 14.133/21 ensejou novos focos de moralismo espontâneo, como com os novos limites financeiros para a dispensa de licitação, no seu art. 75.
Nesse átimo saltaram de seus jazigos os messiânicos salvadores da moralidade pública, os mesmos ungidos pela divindade de sempre, prontos para levar a salvação à comunidade jurídica em perigo !
Sacudindo seu mofo desde logo assumiram a nova missão de indicar para o usuário da Lei nº 124.133/21 o que eles podem comprar e o que não podem, dentro do novo limite de dispensa !
Que seria da espécie humana, e da Administração pública brasileira, sem a participação desses seres superiores – que ensinam a você, mortal indiferenciado, como você pode utilizar o limite fixado no inc. II do art. 75 da Lei nº 14/133/21 ? Enquanto existirem esses seres divinais, donos da verdade jurídica, ainda existirá esperança para a humanidade !
Com todo efeito, diversos artigos foram e vêm sendo publicados na internet dando as fórmulas, os compromissos, as circunstâncias e as condicionantes do uso lícito do limite da lei de licitações.
Ocorre que a lei não contém nada do que aqueles visionários do direito preconizam.
Jurisprudência – que preste, não ensaios iniciais – ainda não existe, quando nem sequer a lei entrou em vigor exclusivo.
Tudo é fruto da espontânea criação daqueles seres iluminados, que se julgam a referência da moral pública e dos bons costumes jurídicos – e mais uma vez em nossa literatura jurídica. Como se o agente público j[a não vivesse repleto de problemas verdadeiros, pesados e sérios, e ainda precisasse de discursos de formatura de colegiais !
VIII – O tema do fracionamento entra em cena. Fracionamento é partição, divisão, seccionamento, fragmentação, ou simplesmente disposição em frações, ou pedaços.
No mundo das licitações essa é a palavra com mais freqüência utilizada - com sentido sempre pejorativo e que não é seu próprio - para referir um vício procedimental, consistente em dividir artificialmente o objeto pretendido de compra para o fim de, em face do menor valor, se escapar da licitação e se dispensar o certame licitatório.
Nesse sentido o artificial fracionamento é mesmo um vício, a ser combatido. Se se fraciona artificialmente algum objeto, boa coisa disso não advirá, com todo efeito ([4]).
O que não se engole é alguém espontaneamente colocar-se a inventar regras, fórmulas e condicionamentos – nenhum dos quais existente na lei – para após, decerto orgulhoso do cumprimento de sua missão redentora, anunciar sua invenção como se fora a regra jurídica doravante.
E não se engolem, pela mesma intragabilidade, ‘instruções normativas’, ´pareceres vinculantes’, ordens de serviço, instruções e circulares que pretendam congelar um momento da necessidade do ente público para determinado e específico caso de compra, como se aquele momento se repetisse sempre e como se as necessidades futuras do órgão se repetissem invariadas.
IX - A Lei nº 14.133/21 sobre esse tema reza apenas o seguinte:
Art. 75. É dispensável a licitação: (...)
II -- para contratação que envolva valores inferiores a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), no caso de outros serviços e compras. (...)
§ 1º Para fins de aferição dos valores que atendam aos limites referidos nos incisos I e II do caput deste artigo, deverão ser observados:
I - o somatório do que for despendido no exercício financeiro pela respectiva unidade gestora;
II - o somatório da despesa realizada com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade.
Então, se assim está redigida a lei, o único que se pode asseverar – porque está escrito e não porque este ensaiísta teve uma visão – é algo como o seguinte:
- o limite de R$ 50.000,00 em verdade é anual e não desparametrado ou indiscriminado. Para tanto deve ser considerado o ano civil, que corresponde ao exercício financeiro, e o limite não pode ser ultrapassado dentro do exercício;
- a lei entrará em vigor exclusivo em 1º de abril de 2.023, após decorrido o primeiro trimestre daquele exercício. Mesmo assim o limite é de R$ 50.000, 00 até 31 de dezembro de 2.023, e não proporcional como algum intérprete talvez pretenda. E assim é simplesmente porque a regra está dada e a lei não a excepciona, desautorizando portanto leituras de alta criatividade.
Ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus, vale dizer, onde a lei não distingue não cabe ao intérprete distinguir.
A ninguém cabe introduzir palavras na lei, nem adoçar o trabalho do legislador à maneira como gostaria de que a lei fosse.
A lei vale pelo seu comando soberano e expresso, não pela sua intenção, pelo seu espírito nem por nenhuma outra dentre tantas invencionices que os inconformados desfilam nas suas teses reluzentes e tão úteis para o direito positivo do Brasil quanto uma broncopneumonia dupla. Se a aplicação do direito vivesse de discursos ... então todo o mundo jurídico seria outro.
Se a lei não saiu como o guardião da moralidade pública desejaria, mesmo assim vale como saiu e não como talvez saísse;
- o limite pode ser exercido, dentro de cada exercício, diz a lei, com objetos de mesma natureza, entendidos como tais aqueles relativos a contratações no mesmo ramo de atividade.
A lei bem que tentou, mas nesse enfoque dificílimo definitivamente não conseguiu ser objetiva o suficiente. Papel sulfite é objeto da mesma natureza que grampeador ? Ou que cola ? Ou que uma tela para projeção ? Carteira escolar tem a mesma natureza de um armário de cozinha ? Pano de prato tem a mesma natureza de colcha para um abrigo municipal ? Barraca tem a mesma natureza de uma pequena casa desmontável ?
Programa de computador é da mesma natureza que uma impressora ? Vassoura é da mesma natureza que sabonete líquido ? Pneu de caminhão é da mesma natureza que cone de trânsito ?
Conserto de motor de trator é da mesma natureza que pintura de veículo ? Remédio é da mesma natureza que produto químico ? Furadeira cirúrgica é da mesma natureza de uma furadeira de oficina ? Seringa é da mesma natureza que um tubo de oxigênio ?
Na prática o comprador ver-se-á em palpos de aranha, e correrá risco se o seu ‘elastério classificatório’ do que seja mesma natureza não coincidir - ao menos em boa parte - com o do agente que o fiscaliza.
E o fiscal também não realizará trabalho nem um pouco fácil, e corre risco de ser leniente demais, ou restritivo além do limite racional que dele se espera.
X – Observe o amável leitor que a lei só em si já contém dificuldades, ou mesmo armadilhas – perigosas. Ninguém, que tenha o que fazer, precisa de autoungidos arautos da moralidade entre os homens, para lhe impor novas dificuldades operacionais que não constem do texto legal.
Os moralistas sempre foram, são e serão per omnia saecula saeculorum uma das mais insidiosas pragas que assolam as pessoas retas e sérias de propósito. Quem é moral não é moralista; quem apregoa a moralidade, como se fosse sua criação ... fuja desse hipócrita !
Aos fiscais, por fim, se ousa recomendar que, quando não for evidenciada a fraude e o abuso injustificável, então que seja plausível, razoável, humano e cordato com o fiscalizado. Ele também está perdido ...
[1] Recordemos alguns episócios de nossa história: a) um dia há alguns anos instituíram-se as imagens holográficas em documentos cartoriais para evitar a sua falsificação. Na semana seguinte já existiam holografias falsas; 2) o saudoso mestre Diógenes Gasparini relatava em cursos que deparou com uma partida de 700 livros falsificados e de péssima qualidade gráfica, entregues pelo vencedor de uma licitação a um órgão público; 3) são conhecidos relatos de falsificação do produto adultarador de gasolina, portanto a constituir adulteração de segundo grau; 4) para nós a maior: delegacia de polícia pirata. Há mais de uma década o noticiário da televisão revelou a existência e o ‘empastelamento’, na alameda Glete, nos Campos Elíseos, centro de São Paulo, uma casa que servia como “delegacia de polícia”, com rocambolescos delegados, policiais, grades e todo o aparato de uma verdadeira. Ali os ‘policiais’ extorquiam desavisados que lhes caíam nas malhas graças a ocorrências ‘plantadas’, e os libertavam mediante propinas.
[2] Com efeito, dentre os milhões de licitações realizadas anualmente no Brasil quantas são de valor estimado maior que duzentos milhões de reais (cf. art 6º, inc. XXII, da nova lei), e quantas são integradas ou semi-integradas, essa estapafúrdia invenção do estapafúrdio RDC – regime diferenciado de contratação ?
[3] O pavor de a autoridade compradora receber uma ação civil pública pela fuça é tão grande nestes tempos conturbadíssimos que até para obter uma namorada essa autoridade talvez cogite licitá-la... e por menor preço.
[4] Se entretanto se fraciona um objeto porque o conjunto total não cabe na repartição, ou porque é remédio que vence antes de ser todo consumido, ou porque é um produto químico que perde a validade se comprado no total supostamente necessário, então em casos assim e em infinitos outros casos de necessidade pública não se trata de fracionamento artificial, mas ditado pelo bom senso e pela administração responsável de materiais.