MUNICÍPIOS JÁ PODEM INVERTER AS FASES DA LICITAÇÃO. O SEPULTAMENTO DAS NORMAS GERAIS DE LICITAÇÃO

MUNICÍPIOS JÁ PODEM INVERTER AS FASES DA LICITAÇÃO. O SEPULTAMENTO DAS NORMAS GERAIS DE LICITAÇÃO

Ivan Barbosa Rigolin 
(dez/11)


I – O título alusivo aos Municípios se explica, mais uma vez, apenas pelo conhecido fato de que falar a outras instâncias da federação, que não os Municípios, costuma recordar a esplêndida figura de d. Quijote de la Mancha a investir contra moinhos de vento ou, como o seu muito ilustre antecessor, a clamar no deserto.  A resposta é invariavelmente nula, enquanto que os Municípios acusam a leitura e, com freqüência, refletem seriamente sobre o que leram, e disso nos dão conta na primeira oportunidade, particularmente em cursos e seminários.

São e serão sempre os Municípios, portanto e por excelência, nossos naturais destinatários (1).

O tema em verdade se aplica invariavelmente a qualquer pessoa de direito público integrante da federação brasileira, sejam os Estados e o Distrito Federal, além dos Municípios. Mas para muitos Estados não existirá novidade alguma no texto a  seguir.

II – A Lei nº 8.666/93, como se sabe à exaustão há quase duas décadas, é o feixe nacional das normas gerais de licitação e de contratos administrativos de nossa república.

Isto significa o conjunto as regras que exercitaram a competência da União constante do inc. XXVII, do art. 22, da Constituição Federal, de ditar por lei sua, e privativamente sua – basta ler o caput do artigo constitucional – aquele conjunto de normas que pela sua generalidade e sua feição principiológica se aplicam a todos os entes públicos brasileiros por força da própria Constituição, assim redigida:

“Art. 22   Compete privativamente à União legislar sobre:     (...)

XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, inc. XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 178, § 1º, III;”

Todos os doutrinadores, os estudiosos e os aplicadores da lei, de dentro do serviço público e da iniciativa privada,  sempre e invariavelmente desde que a lei foi promulgada em 1.993, se posicionaram aberta e escancaradamente  contra  a previsão do art. 1º da lei, segundo o qual

“Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”

Não é para menos. Com todo efeito, não passa pela imaginação de ninguém dotado do mínimo senso de lógica jurídica que alguma lei, de mais de 120 (cento e vinte) artigos, por vezes muito longos e muito pesados,  possa conter apenas normas gerias de licitação e contrato administrativo.

A idéia é malsã e torpe, para não dizer juridicamente escabrosa, e tecnicamente despropositada como pouca coisa mais no direito brasileiro.

III – Tão fora de senso se revela a idéia que os arts. 89 a 98 da lei, juntos com o art. 99,  constituem a Seção III do seu Capítulo IV. Essa Seção se denomina Dos crimes e das penas, e de fato contém a tipificação de diversos crimes em licitação e em contratação, que sujeitam seus praticantes a processos criminais e penas de detenção e de multa.

Alguém no universo já viu um crime  ser norma geral de alguma matéria jurídica?

Se é norma geral, então naturalmente precisa ser observada, como todas as normas gerais precisam ser cumpridas por força da Constituição, art. 22, inc. XXVII, e da Lei nº 8.666/93, art. 1º, parágrafo único.

Assim sendo, pela lógica da lei de licitações  é preciso praticar os crimes previstos na lei, ou de outro modo se estará descumprindo as normas gerais de licitação e de contrato !

Alguém já testemunhou disparate mais absurdo em algum diploma jurídico no Brasil ?

É essa a nossa lei de licitações...

IV – A modalidade licitatória do pregão presencial despontou no Brasil há relativamente pouco tempo, em 17 de julho de 2.002, com o advento da Lei nº 10.520, daquela data.

Ainda que formalmente proibido pela lei de licitações, cujo § 8º do art. 22 proíbe a criação de novas modalidades ou a combinação das existentes, o legislador federal com isso não se incomodou, e converteu em lei  uma Medida Provisória editada 18 (dezoito) vezes desde maio de 2.000, instituindo com isso o pregão presencial para todos os entes federados – ao invés de apenas para a União como fora ao longo daquelas 18 edições da MP.

Estava então instituída a sexta modalidade licitatória, e a lei...  ora, a lei!..

Quando o governo quer sempre ressuscita o velho Getúlio Vargas, a quem se atribui esse rompante segundo o qual aos amigos, tudo; aos inimigos a lei.  E, dizem, arrematava ainda o caudilho: - a lei ?    Ora, a lei !  

O panorama quanto a isso não se alterou tanto, entretanto, daquele tenebroso Estado Novo.

O governo federal, com todo efeito, deu-se de ombros à lei existente, e, quase em desespero por maior agilidade nas licitações que efetuava – como todo os governos locais também se achavam -, achou por bem de instituir uma sexta modalidade licitatória inquestionavelmente mais ágil, o pregão.

A muito maior agilidade do pregão, como concebido nas citadas MPs e depois na Lei nº 10.520/02, se dava por dois fatores fundamentais:

primeiro) os licitantes, que iniciam suas propostas por escrito, podem a seguir batê-las por novos lances verbais, até atingirem preços verdadeiramente vantajosos para a Administração – quando não até mesmo perigosos por inexeqüíveis,  ou perto disso, e

segundo) e o mais importante, é que no primeiro momento do certame são abertas julgadas as propostas e então declarado o vencedor dessa fase, e apenas após julgadas as propostas é que segue a fase de habilitação, e  apenas do vencedor das propostas, e não de todos os licitantes como nas modalidades tradicionais. O Estado de São Paulo, como adiante se verá, examina a habilitação dos três primeiros classificados na fase de propostas.

Todos sabem que a fase “emperrada” da licitação, muito burocrática e trabalhosa, e que com freqüência trava o andamento do certame, amiúde por muitos meses ou até anos,  é a habilitação.  Julgar as propostas, ante as dificuldades operacionais extrínsecas da habilitação,  costuma constituir brincadeira de criança, que se resolve, no dizer correntio, em dois tapas.

Assim, o que aquela abençoada inversão de fases poupa de tempo tanto para o poder público quanto para os licitantes é algo simplesmente extraordinário, monumental, a ponto de facilmente  o ente licitador poder resolver todo o certame, adjudicar o seu objeto ao vencedor e contratá-lo no mesmo dia da abertura.

Basta, para tanto,  que ninguém proteste por recorrer dos julgamentos (propostas e habilitação) durante a sessão, hipótese em que o pregoeiro imediatamente adjudica o objeto ao vencedor do certame e faz o expediente subir para homologação e contratação pela autoridade superior, o que pode, tudo isso, acontecer no mesmo dia – e com sobra de tempo para tomar cafezinho, comentar a última rodada do campeonato e amaldiçoar o resultado da loteria.

Se a questão é agilitar a licitação, então o grande achado do século foi o pregão, e, como até aqui apenas se mencionou o presencial,  lembre-se que o mesmo se pode concluir quanto ao pregão eletrônico, regido pelo Decreto nº 5.450, de 31 de maio de 2.005, que em verdade se pode considerar a sétima modalidade licitatória em face das essenciais diferenças operacionais que guarda com relação à modalidade presencial (2).

V – O Brasil inteiro aguarda com ansiedade máxima que a lei de licitações dê vez a algo operacionalmente muito mais ágil e lépido, como é o pregão.  A sua oralidade antes da burocracia e dos mundos de papéis, e a possibilidade de o mesmo licitante cobrir a sua proposta inicial, constituem o sonho alcandorado dos licitadores e dos licitantes, o paraíso licitatório sobre a terra.

A lei de licitações ensaia uma mudança, mas ou menos radical, desde fevereiro de 1.997, quando foi publicada no DOU uma minuta de anteprojeto de lei que substituiria  a Lei nº 8.666/93. Deu-se um mês para que a sociedade opinasse sobre aquele projeto, decerto tão melhor que a lei atual quanto  o automóvel frente ao carro de bois, ou a penicilina frente a uma pajelança.

O mês se foi. Outro foi dado. Foi-se também. Onde foi parar aquele projeto nem as pitonisas reunidas em grande assembléia saberiam.   Ninguém  jamais detectou ou divisou o paradeiro daquele trabalho, e assim até o dia de hoje.

Pouco anos após, outro projeto de lei – desta vez absurdamente péssimo, com 196 (cento e noventa e seis) artigos que previam até mesmo júri para  julgar licitações, se intentou. Ante a incontenível repugnância  que ensejou entre os praticantes da matéria, e mesmo que logo a seguir substituído por outro de apenas 175 (cento e setenta e cinco) artigos – e ambos tão-somente para compras e para serviços comuns, mantendo-se a Lei nº 8.666/93 para obras e  serviços de engenharia ! -  teve o merecido destino de desaparecer a vista e da lembrança de todos, como todos os pesadelos merecem ter.

Com isso, a indagação extremamente aflitiva e angustiante permanece viva:  e a nova lei de licitações, quando virá ?   Quando porventura o país se livrará da sua pior lei de todos os tempos sobre qualquer matéria ?  

Sem resposta.

VI – Pelos idos de 2.000, e ainda imerso num panorama legislativo como este acima sumariado,  o governo federal terá experimentado aquela sensação descrita pelo ilustre compositor popular, e com seus botões ter-se-á estatuído: não dá mais para segurar.

Não mais parecia possível contemporizar com uma lei que por vezes fazia tardar anos a fio, paralisados por incontáveis medidas liminares a pipocando a todo tempo em ações judiciais, muitas licitações que realizava, sobretudo de grandes obras e de complexíssimos serviços de todo gênero, de cujos objetos precisava com absoluta urgência. Algo precisava ser feito sem nenhuma delonga, já que lei básica alguma ia adiante no Congresso.

A lei proibia criar outra modalidade licitatória, porém numa quadra semelhante de institucional desespero a lei... ora,  a lei(3).

Eclodiu assim a primeira Medida Provisória, nº 2.026, de 4 de maio de 2.000, instituindo o pregão presencial apenas para a União licitar – agilissimamente – serviços comuns e compras.  Após dezessete reedições, a Medida Provisória nº 2.182, de 23 de agosto de 2.001, foi enfim convertida na lei do pregão presencial, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2.002.

A União não esperou, e por lei sua inverteu as fases da licitação na nova modalidade para contratação de serviços comuns e bens, permitindo-se com isso ganhar um tempo extraordinário no procedimento para adquirir esses objetos.  Atropelou-se a lei de licitações,mas isso não comoveu minimamente ninguém no país senão os formalistas do direito – entre os quais nós -, esses eternos ingênuos surpreendidos a cada novo dia por agressões de todo gênero à letra da lei, num país que se diz juridicamente positivista.

E o Congresso, em tema de lei de licitações, perdeu o trem da história.

VII – Passados menos de três anos do advento da lei do pregão, o Estado da Bahia, que já tivera tempo de observar que reação eficaz alguma ocorreu no direito à violação da proibição formal, constante da lei de licitações, de se criar nova modalidade licitatória, e de se inverterem as fases da licitação,  resolveu ousar e repetir a idéia da inversão das fases na sua lei estadual de licitações.

Editou com isso a Lei nº 9.433, de 1º de março de 2.005, cujo art. 78 assim dispõe:

Art. 78 - A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos:

I - abertura dos envelopes contendo as propostas de preço;

II - verificação da conformidade e compatibilidade de cada proposta com os requisitos e especificações do edital ou convite e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados pela Administração ou por órgão oficial competente ou, ainda, com os constantes do sistema de registro de preços, quando houver, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis;

III - julgamento e classificação das propostas, de acordo com os critérios de avaliação constantes do ato convocatório;

IV - devolução dos envelopes fechados aos concorrentes desclassificados, contendo a respectiva documentação de habilitação, desde que não tenha havido recurso ou após a sua denegação;

V - abertura dos envelopes e apreciação da documentação relativa à habilitação dos concorrentes classificados nos três primeiros lugares;

VI - deliberação da comissão licitante sobre a habilitação dos três primeiros classificados;

VII - convocação, se for o caso, de tantos licitantes classificados quantos forem os inabilitados no julgamento previsto no inciso anterior;

VIII - deliberação final da autoridade competente quanto à homologação do procedimento licitatório e adjudicação do objeto da licitação ao licitante vencedor, no prazo de até 10 (dez) dias após o julgamento.”  (Os destaques são nossos).

Observa-se pelos trechos em destaque que a lei baiana se inspirou diretamente na  lei federal do pregão, e também inverteu as fases do procedimento em qualquer modalidade, não apenas no pregão.

VIII - Rapidamente o Estado da Bahia foi imitado pelo Estado de Sergipe com a  Lei nº 5.848, de 2.006,  em seguida pelo do Paraná, com sua Lei nº 15.340, de 22 de dezembro de 2.006, e após isso pelo de São Paulo, que editaram leis invertendo as fases da licitação.

O Estado de São Paulo editou sua Lei nº 13.121, de 7 de julho de 2.008, que também inverteu as fases da licitação, alterando com isso a Lei nº 6.544, de 1.989.  Nesse momento uma ação direta de inconstitucionalidade foi movida contra a lei paulista pela Central Brasileira do Setor de Serviços – CEBRASSE, a qual ADIn tomou o nº 4.116, no e. Supremo Tribunal Federal.  A liminar suspensiva pedida foi indeferida. O Min. Relator César Peluso emprestou à ação o procedimento da Lei nº 9.868, de 1.999, e o mérito aguarda julgamento.

Entendemos que dificilmente será julgada inconstitucional a lei paulista, se não por motivos exclusivamente jurídicos, por questões operacionais, funcionais, práticas e políticas, tudo numa combinação “ideal”.

Frise-se que o e. Tribunal de Contas do Estado vem aceitando pacífica e incontestadamente a aplicação da lei paulista, que inverteu as fases de licitação.

IX – O que mais importa ter presente neste momento, entretanto, é a iniciativa do Município de São Paulo de imitar os quatro Estados citados, ao editar a sua Lei nº 14.145, de 7 de abril de 2.006.

Por essa lei, que alterou sua Lei nº 13.278, de 7 de janeiro de 2.002,  o maior Município do Hemisfério Sul também passou a inverter as fases das licitações que realiza, e assim reza o seu art. 1º:

“Art. 1º O artigo 16 da Lei nº 13.278, de 7 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 16. As modalidades de licitação são aquelas previstas na legislação federal e o processamento de cada uma delas no Município de São Paulo estará sujeito às normas específicas previstas nesta lei, devendo obedecer ao seguinte procedimento:

I - no dia, hora e local designados, será realizada sessão pública para recebimento dos envelopes contendo a proposta e os documentos relativos à habilitação, bem como da declaração dando ciência de que o licitante cumpre plenamente os requisitos de habilitação;

II - abertura dos envelopes contendo as propostas dos concorrentes;

III - verificação da conformidade e compatibilidade de cada proposta com os requisitos e especificações do edital ou convite e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados pela Administração ou por órgão oficial competente ou, ainda, com os constantes do sistema de registro de preços, quando houver, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis;

IV - julgamento e classificação das propostas, de acordo com os critérios de avaliação constantes do ato convocatório;

V - devolução dos envelopes fechados aos concorrentes desclassificados, contendo a respectiva  documentação de habilitação, desde que não tenha havido recurso ou após a sua denegação;

VI - abertura dos envelopes e apreciação da documentação relativa à habilitação dos concorrentes cujas propostas tenham sido classificadas até os três primeiros lugares;

VII - deliberação da Comissão de Licitação sobre a habilitação dos três primeiros classificados;

VIII - se for o caso, abertura dos envelopes e apreciação da documentação relativa à habilitação de tantos concorrentes classificados quantos forem os inabilitados no julgamento previsto no inciso VII deste artigo;

IX - deliberação final da autoridade competente quanto à homologação do procedimento licitatório e adjudicação do objeto da licitação ao licitante vencedor, no prazo de 10 (dez) dias úteis após o julgamento.”  (Destaques nossos).

Desta vez um Município aderiu à idéia de inverter as fases de licitação na sua lei, seguindo de perto a iniciativa de alguns Estados-membros da federação.

Pratica serena e indisputadamente sua lei, sem contestação alguma de quem quer que seja e com a aprovação do e.Tribunal de Contas do Município de São Paulo. 

X – Não parece necessário prosseguir na história, que de resto é já sobejamente conhecida e sabida nos meios jurídicos, publicísticos e empresariais do país.

Além do vasto noticiário que se multiplica, já existe doutrina considerável sobre o tema das leis locais que inverteram as fases da licitação. 

O artigo que nesse tema mais nos chamou a atenção foi A constitucionalidade da inversão das fases procedimentais da lei de licitações do Estado da Bahia, de Eduardo Amin Menezes Assan, ilustre Procurador do Município de Salvador, no qual o autor discorre atenta e detidamente sobre a questão da alegável inconstitucionalidade daquela inversão, concluindo pela sua constitucionalidade com argumentos que merecem exame e reflexão. (4).

Mas o que importa trazer aqui à atenção é uma conclusão a que, em sã consciência e friamente,  se precisa chegar, e que se destaca

- a esta altura dos acontecimentos legislativos e jurídicos é impossível pretender que qualquer Município, como qualquer Estado, esteja proibido de editar lei que inverta as fases procedimentais das licitações que realize.

Não mais cabe ao que tudo indica, e ante a ausência de medida restritiva pelo e. STF face à ADIn proposta contra a lei paulista que inverteu as fases de licitação, e ante ainda a pacífica aceitação pelos Tribunais de Contas das leis estaduais e da lei paulistana que inverteram as fases da licitação,  imaginar que algum Município esteja impedido de fazer o mesmo, imitando estes referidos entes da federação.

Podem a esta altura – impossível virar a cara à realidade nua e crua do presente estágio do direito – todos os Municípios brasileiro editar leis que invertam as fases da licitação.

Os médios e os pequenos Municípios brasileiros, como a dizer-se eu também quero, já podem perfeitamente, do plano jurídico e institucional, seguir São Paulo e editar sua lei de licitação que inverta as fases do procedimento. Não importa que São Paulo tenha 11 milhões de habitantes, porque institucionalmente está rigorosamente no mesmo plano em direitos constitucionais de, por exemplo, Borá, com seus 900 habitantes.

Com todo efeito, se os Estados podem fazê-lo e o fizeram; se o Município de São Paulo há mais de 5 (cinco) também inverteu as fases de licitação por lei sua, então pela regra constitucional da  isonomia ou da igualdade,  então todos os demais Municípios brasileiros poderão editar leis semelhantes, podendo inspirar-se em tudo que desejarem nos modelos já existentes.

XI – Recorde-se, como desnecessário epílogo, que  a atual lei federal das concessões de serviço público, a Lei  nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1.995, no art. 13 admite a inversão das fases operacionais  das respectivas licitações para a contratação daqueles objetos.

A recente lei do RDC - Regime  Diferenciado  de Contratações – a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2.011, no seu art. 12 inverteu as fases tradicionais do procedimento licitatório – apreciando-se antes as propostas, depois a habilitação dos licitantes.  (E dessa lei se afirma, a boca cada vez menos pequena, que é o ensaio de uma nova lei de licitações)

A lei das PPPs – Parcerias Público-Privadas, a Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2.004, no seu art. 18-A admite a inversão das fases proc3ediemntias nas  licitações daqueles objetos.

As normas gerais de licitação foram pisoteadas e trituradas por diversas iniciativas da União nos pregões, e a seguir por alguns Estados-membros  e pelo Município de São Paulo, sem contestação alguma à vista, mas ao contrário com o aplauso invariável de todos quantos lidem com a matéria de licitações.

Talvez já se possa inserir nos compêndios de direito constitucional legislado a modalidade da revogação pelo desuso, e as normas gerais de licitação, péssima e infelicissimamente  enfeixadas no elenco da Lei nº 8.666/93,  cada vez mais se comprova que  representam  tudo menos normas gerais do que quer que seja.

Que a terra seja leve àquela tenebrosa idéia assim como a toda a  Lei nº 8.666/93, que a cada dia em que ainda permanece em vigor acrescenta um quê de infelicidade aos profissionais da área jurídica de nossa república.

 



(1) Abra-se uma muito honrosa exceção, quanto a órgãos estaduais, ao e. Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, do qual temos há bom tempo testemunhado uma proverbial deferência e atenção.

(2)  A grande limitação do pregão é o escopo do seu possível objeto, que pela lei recai apenas sobre serviços comuns e sobre compra de bens – mas mesmo esse limite vem ficando cada vez menor, com os Tribunais crescentemente a admitir pregões para obras, e serviços de engenharia, tidos como os mais simples ou menos complexos, e assim transparentes. É o caso das obras de pavimentação, por exemplo, que hoje pacificamente já se licitam por pregão. 

(3). Num quadro assim, não se recrimina tanto a idéia da instituição da sexta modalidade licitatória, o que a lei de licitações textualmente proibia fazer. Uma lei se modifica por outra, e o que tecnicamente precisava ter sido feito era apenas  modificar-se a Lei nº 8.666/93 para admitir a nova instituição, ou para a própria lei existente instituir o pregão, com isso sem renegar o seu próprio texto proibitivo.  Trata-se portanto de mera técnica legislativa em jogo, e não de outro problema. Os motivos eram e são mais do que justos e ponderáveis, e contra eles nada se poderá argüir.

(4) Publicado in Jam Jurídica, BA,  ed. especial 2.011, p. 11 e seguintes.